Guilherme

 

 Há quatro anos, depois de passar a tarde toda entre 2 hospitais, estava eu, triste, com 2 indicações de cesárea, conversando muito com meu filhote Guilherme, acarinhando a barriga, explicando que eu não forçaria ele a sair de forma nenhuma, mas que a pressão tava grande de novo, se ele sentisse que estivesse pronto, que me desse um sinal.

 

 E às 0hs, a bolsa rompeu. O sinal que ele tava pronto sim, que me ouviu. Sorriso enorme em meu rosto, deitei para descansar um pouco. De madrugada, nem lembro mais que horas, resolvemos ir para o hospital, sem sinal nenhum de contrações. E tomei um belo chá de cadeira lá (tá vendo quando a bolsa rompe não precisa correr pra maternidade?), e só fui pra sala de pré parto depois das 9h da manhã.

 

 Todo o desrespeito possível a um ser humano, foi o que eu vi. Isso porque logo de cara quis recusar a tricotomia, e não permitiram. E nem acompanhante. E nem a doula no pré parto. Nem com lei impressa com meus direitos. Nada. E ainda sim estava feliz! Afinal, não me encaminharam pra cesárea dos outros hospitais. Absurdo tem de se contentar né? É o mesmo que a esmagadora maioria das mulheres SUS dependentes passam. Porque nem gemer, gritar, elas podem. Eu não tava nem ai quanto a isso, eu falava pras gestantes ao meu lado para vocalizar mesmo, abrir a boca, se abrir e permitir que seus filhos viessem. E nada de dores, mesmo com a indução com ocitocina.

Hoje eu realmente não lembro da dor. Só das contrações na qual em vez de me encolher, me esticava toda e vocalizava. Uma hora mais ou menos antes do parto, lembro das contrações mais fortes e pedi para ir ao chuveiro. E como foi bom sentir a água. E eu agachei e veio a vontade de empurrar. E entraram no banheiro e me carregaram, eu lutando e pedindo pra me deixar ali, ter meu filho em paz, mas me colocaram na maca pro centro cirúrgico. Lembro que tive várias pessoas me segurando porque eu não queria a merda da analgesia e mesmo assim fizeram. Eu não era eu mais racionalmente. Só lembro de perguntar do meu companheiro. De me deitarem, de falarem para eu parar de gritar, de eu não empurrar. E lembro do choro baixinho do meu Gui, que como ele mesmo fala hoje “nasceu da minha pipita”.

 

 É, ele conseguiu, nós conseguimos. Não da melhor maneira, como a maioria das crianças, afinal, oprimidos são oprimidos desde o nascimento né?

 

 Passamos todo o dia na sala de pós parto por falta de quarto. Sem contato com família, com o companheiro, sem roupas, ele embrulhado num cobertor, eu enrolada em lençóis sem nem direito a um absorvente pós parto. Mas ficamos o tempo todo juntos mesmo, e tão calminho meu menino…

 

 Claro que não foi o parto que sonhei para ele, que na verdade passou bem longe. Mas ainda sim foi bem melhor do que o de minha filha, que foi arrancada, nascida no desespero.

 

 E porque eu milito pela humanização do nascimento? Porque não acho certo que as mulheres tenham de lutar tanto simplesmente para parir. Porque não desejo para ninguém o que passei, o que as mulheres passam todos os dias nas maternidades públicas. Quero que todas possam ter um nascimento digno, a base de tudo!

 

Erika

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